quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Checagem do Zé




Colaboração via email de um amigo que assina apenas Fenix120. Resta então agradecer pela excelente matéria enviada, mandou muito bem, prossiga!

Boa leitura a todos! Não sei como será com vocês, mas eu quase infartei  na hora da "chumbeira" porque até então eu ainda estava meio em dúvida sobre a natureza dessa mensagem...


"Gente, este é para quem gosta de aviação e ainda tem o seu brevet, embora guardado - mofado -lá no fundo de uma gaveta...
Pelo menos vai relembrar de alguns termos usados no texto.
Carta que um fazendeiro de Mato Grosso enviou a um deputado pedindo ajuda



Oi, amigo deputado,

Estou te escrevendo porque eu preciso que você me ajude a tirar essa porra de carteira de piloto de novo. Você vive me dizendo que conhece todo mundo, pois esta é a sua chance de ajudar um velho amigo, porquê eu estou desesperado. Isso tudo aconteceu por causa do meu último recheque com o checador do DAC.

Quando o checador, Major Sergio me telefonou, ele até me pareceu um cara razoável, legal. Aí ele, muito educadamente, me relembrou da necessidade de fazer um vôo de recheque a cada dois anos. Ele até se ofereceu para vir guiando até a minha fazenda, e fazermos o recheque na minha própria pista. Naturalmente, eu aceitei.

Bom, ele apareceu na ultima sexta feira. Primeiro ele disse que estava surpreso de ver o avião numa pistinha tão pequena ao lado da sede, porque a pista homologad a fica a mais ou menos 10 quilômetros dali. Eu expliquei que usava esta pistinha porque ela era muito mais perto do que a homologada e, apesar das linhas de força que cruzam o meio dela, isso não era um problema, porque nesse ponto da pista ou você já decolou ou já pousou.

Eu não sei porquê, mas o Sergio parecia nervoso. Então, apesar de eu ter feito a inspeção pré-vôo só 4 dias antes, eu decidi fazer tudo de novo. Só porque ele estava me observando atentamente, eu dei duas voltas ao redor do avião em vez de uma de costume. Meu esforço foi recompensado
porque, finalmente, a cor voltou ao rosto dele. De fato ele ficou até um pouco vermelho.

Vendo que agora ele estava de bom humor, eu perguntei para ele se eu podia aproveitar o recheque com um pouco de trabalho da fazenda, porque eu tinha que levar três leitões que estavam perto da sede, até o pasto do outro lado.

Depois de muito custo, finalmente, eu consegui caçar os três leitões e joguei eles a trás do velho 172. Nós subimos a bordo, mas o Sergio começou a me questionar sobre peso e balanceamento e toda essa baboseira.

Claro que eu já ouvi falar dessa coisa. Mas eu sei que isso ai é perder tempo porque os leitões não param quietos, principalmente quando percebem que estão 500 pés acima do solo. Está na cara que não adianta fazer peso e balanceamento porque não se consegue segurar eles. Então falei pro Major Sergio não se preocupar porque eu sempre deixo o compensador no neutro para ter certeza de que o avião fica estabilizado a qualquer momento do vôo.

Bom, de qualquer forma, eu dei partida e, rapidamente, para diminuir o tempo do motor esquentar, pisei forte nos freios e taquei 2.500 RPM. Foi ai que eu descobri que o Sergio tinha um bom ouvido. Apesar de ele estar com os fones de ouvido, e com o barulhão do motor, ele conseguiu detectar umas batidinhas metálicas e quis saber o que era. (Na verdade esse barulho começou há um mês atrás e é causa do por uma chave de fenda que caiu num buraco que tem no assoalho do avião e engastalhou na seletora de combustível. Não dá para virar a seletora agora, mas acho que não tem muito problema porque já que ficou travado em ambos, acho que está ok)

De qualquer forma, como o Major era um chato, eu disse que o barulho era de uma garrafa térmica de inox que eu sempre deixo no painel, entre o pára-brisas e a bússola.

Acho que ele aceitou minha explicação porquê ele puxou o banco para trás e ficou olhando fixamente para o teto da cabine.

Eu soltei os freios para taxiar, mas infelizmente o avião deu um tranco e uma guinada para direita. Eu pensei: "porra, o amortecedor da direita quebrou de novo!" O tranco deixou o Major esperto novamente. Ele olhou assustado justo a tempo de ver uma pedra atirada pela hélice estilhaçar o pára-brisas do seu Honda novinho. Eu pensei comigo: "agora to encrencado"...

Enquanto o major estava ocupado olhando pro seu carro, eu ignorei seu pedido de taxiar até a pista principal e decolei da pistinha mesmo, por baixo das linhas de força. O major não disse uma palavra, bom, pelo menos até quando o motor começou a ratear justo na hora de tirar o 172 do chão; aí ele começou a balançar a cabeça e falava, 'Ai meu Deus! Ai meu Deus! Ai meu Deus!'

"Fica frio Major" eu falei firmemente. "Isso quase sempre acontece nas decolagens, mas existe uma boa razão para isso".

Eu expliquei para ele, com toda paciência do mundo, que eu sempre uso gasolina comum no avião, mas um dia, por acaso, eu coloquei um ou dois galões de querosene. Para compensar a baixa octanagem do querosene eu coloquei um pouco de gasolina azul aditivada, e balancei a asa para cima e para baixo algumas vezes para misturar tudo. Depois dessa vez o motor começou a ratear um pouco, mas normalmente ele trabalha bem, (isso se a pessoa souber balançar direitinho).

De qualquer forma, a essa altura o major pareceu perder todo o i nteresse no meu vôo. Ele tirou do bolso um rosário, fechou os olhos e começou a orar (eu não imaginava que alguém nestes dias fosse tão católico). Aí, eu coloquei uma música suave no rádio HF para ajudá-lo a relaxar. Enquanto isso, fui subindo para minha altitude normal de cruzeiro: 8.500 pés. Eu normalmente não faço plano de vôo ou pego o Metar, porquê aqui na fazenda você sabe que não tem essas coisas, e normalmente aqui está cavok (mas desde que eu quase dei de frente com um Sêneca, acho que tenho que repensar melhor isso).

Bom, quando eu estava nivelando, eu vi lá embaixo um bando de porcos do mato se dirigindo para o meu pasto novinho. Eu detesto esses bichos e sempre levo uma 12 carregada no lado da porta do Cesnna para o caso de eu ver esses malditos bichos. Nós estávamos muito alto para eu poder acertá-los, mas por uma questão de princípios resolvi fazer uma curva para ver melhor.

Amigo, quando eu saquei a 12, o efeito no Major foi feito um choque elét rico. Conforme eu disparei o primeiro tiro o pescoço dele se alongou uns 10 centímetros e os olhos dele pareciam os de um coelho com gripe. Ele parecia ter tocado numa cerca elétrica com 100.000 volts. De fato a reação dele foi tão violenta que eu perdi toda a concentração por um instante, e o tiro seguinte acertou direto no pneu esquerdo. O major parecia preocupado com os tiros (provavelmente era membro dessas sociedades protetoras de animais); então, eu decidi não contar nada desse nosso pequeno problema com o pneu.

Logo em seguida eu localizei a manada principal e decidi fazer meu pequeno truque de piloto de caça. O major voltou a rezar baixinho. Aí, eu, numa seqüência suave, dei full flap, cortei o motor e comecei a glissar de 8.500 para 500 pés com uma velocidade indicada de 140 nós (pelo menos a ultima vez que eu olhei estava) com a agulha do velocímetro entrando na faixa vermelha. Que confusão! No meio da descida eu olhei para trás da cabine para ver os 3 leit ões graciosamente suspensos no ar e urrando feito loucos.

Eu até ia comentar com o Major essa vista incomum, mas ele estava meio verde, se enrolou na posição fetal e sua cabeça tremia.

A mais ou menos 500 pés eu tentei nivelar mas não sei porquê continuei afundando. Quando chegou nos 50 pés eu dei full power mas nada aconteceu, nem um barulho, nada. Aí, por sorte, eu lembrei da voz do meu instrutor falando "ar quente do carburador, ar quente!". Então, eu puxei o ar quente e isso funcionou porquê o motor finalmente reagiu. Putz, deixa eu te contar, essa passou perto, bem perto!

Aí, amigão, você nem imagina o que aconteceu depois. Nessa altitude nós entramos numa nuvem de poeira levantada pelo estouro da manada, e de repente, entramos IFR. Amigão, vou te dizer, você ficaria orgulhoso de mim porque nem cheguei a entrar em pânico, mas eu tomei nota mentalmente de tirar uma carteira IFR, tão logo eu conserte meu giro direcional (já estou pensando em consertá -lo faz uns dois anos).

De repente, o pescoço do Major se esticou de novo e os olhos esbugalhados reapareceram. Ele abriu a boca, bem aberta, mas não saia nenhum som. "Fica frio", eu falei para ele, "nós vamos sair dessa num minuto". E foi o que aconteceu; um minuto depois nós emergimos da poeira nivelados e ainda a 50 pés.

Vou te confessar uma coisa: aí quem se assustou fui eu, quando percebi que estávamos de dorso. E continuei pensando comigo mesmo: "tomara que o major não tenha percebido que eu esqueci de ajustar o QNH quando estávamos taxiando". Esse pequeno incidente me forçou a voar para um
vale próximo aonde consegui fazer meio tunneau e ficar de cabeça para cima de novo.

Nesse meio tempo a manada se dividiu em dois grupos, deixando uma trilha estreita no meio deles. "Ah", eu pensei, "olha uma trilha. Vamos pousar logo ali". Sabendo que o problema do pneu demandava uma aproximação lenta eu fiz uma série de curvas com full flap. Ai a buzina de stall tava tocando tão alto nos meus ouvidos que eu desliguei o disjuntor para parar o barulho, mas então eu percebi que nós estávamos devagar mesmo, já estolando. Fiz uma final duns 30 metros e joguei o avião no chão com um baita tranco... Amigo, eu sempre tinha pensado que, para dar um cavalo de pau, você tinha que ter um convencional, mas isso provou que eu estava errado de novo.

No meio da nossa terceira virada, o Major finalmente recuperou seu senso de humor. Vamos falar de risadas!

Eu nunca tinha visto nada assim. Ele não conseguia parar. Finalmente eu soltei os leitões, que saíram correndo do avião desesperados.

Aí, eu desci e comecei a pegar chumaços de grama. O major não parava com o acesso de riso, e perguntou o que eu estava fazendo. Eu expliquei que estava recheando o pneu furado com grama para a gente poder voar de volta para a sede. Foi aí que o Major perdeu a pose e começou a correr
para longe do avião. Dá para acreditar nisso? A ultima vez que eu o vi ele estava balançando os braços e eu ainda ouvia sua risada (eu ouvi dizer depois que ele foi internado num sanatório psiquiátrico). Pobre homem!

De qualquer forma, amigo, chega de falar do Major. O problema é que eu acabei de receber uma carta do DAC, cassando, (foi assim que eles escreveram) minha licença de vôo, até que eu faça um curso completo de piloto privado e um cheque de proficiência.

Bom, agora eu admito que errei em taxiar com o amortecedor quebrado e não ter ajustado o QNH usando a elevação da pistinha, mas eu não vejo o que fiz de tão errado para eles cassarem minha carteira. Você também não acha?

Conto, então, com a sua ajuda para evitar que os homens do DAC cassem a minha licença, ok?

Abração do amigo


 

Autoria do texto: desconhecida, se alguém souber quem escreveu, por favor nos informe. A foto foi "pescada" de um álbum de Orkut ainda em 2008, anotei apenas o nome Anderson e não posso garantir que seja dessa pessoa. Assim, se alguém souber, pode nos informar tambéem!


E se você quiser também nos mandar uma matéria como essa, será muito benvinda! Se tiver ou souber de alguma história com Paulistinha também! Não precisa ser aventuras mirabolantes, nada, apenas vivência...

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